O sono, esse injustiçado!

Enquanto se dorme, o cérebro está ocupado a consolidar as memórias, a
reparar danos físicos e a gerar sonhos. Durante a maior parte do tempo, não
se tem consciência de todo este trabalho, mas tem decorrido ao longo de toda a
nossa vida. E a nossa vida depende dele. A privação do sono tem efeitos
imediatos na capacidade de concentração, de ajuizar bem, de agir sob pressão
e de se ser criativo. A privação de sono a longo prazo pode afetar a saúde
mental e a condição física.
(Alex Soojung-Kim Pang, 2017, p. 163)
O horário de ir para a cama, o horário de levantar e o número de horas de
sono, são questões que quase sempre instalam algum nível de apreensão,
quando faço o levantamento da história desenvolvimental, relacionada com o
problema ou motivo que levou ao pedido de ajuda, junto dos pais das crianças
que avalio e acompanho em consultas de psicologia. A apreensão está, na
grande maioria das vezes, relacionada com o horário tardio da hora de ir para a
cama e, consequentemente, com o reduzido número de horas dedicadas ao
sono.
Na verdade, o sono, talvez por constituir uma necessidade tão natural, acaba
muitas vezes por não ter sobre si o merecido reconhecimento e atenção. No
entanto, é precisamente por se tratar de uma necessidade básica que se torna
tão importante que lhe asseguremos a devida qualidade. Valerá então a pena
clarificarmos o que se pode definir como sono. Para o neurologista Ângelo
Soares, autor da obra “O sono – efeitos da sua privação sobre doenças
orgânicas”, o sono constitui-se como um estado anatómico e funcional de
desligar da relação com o mundo exterior para que o cérebro possa trabalhar
para si próprio, dedicando-se às atividades necessárias ao seu funcionamento
normal. E é a própria estrutura anatómica e fisiológica do cérebro que nos
obriga a dormir pois, como qualquer máquina, o organismo tem necessidade
de parar e de “descansar”. Mas, de acordo com o referido neurologista, não
será bem descansar, já que é justamente quando estamos a dormir que o
cérebro trabalha mais.
Enquanto dorme, o cérebro desliga-se do ambiente exterior e centra-se em
tarefas relacionadas com as suas funções e estruturas, nomeadamente com os
processos de armazenamento de informação, mais conhecidos por
mecanismos de memorização ou memória.
Neste ponto, ficamos já elucidados sobre a crucial importância de se ter algum
respeito pelo cumprimento das necessidades relacionadas com o sono. E é
habitualmente nele que, como inicialmente referi, nos detemos durante as
consultas. Como podem as crianças e os adolescentes, em etapas fundamentais
do seu percurso desenvolvimental, manterem bons níveis de bem-estar, de
equilíbrio emocional, de concentração e ritmo de aprendizagem com um
número tão reduzido de horas de sono?
Dito isto, muitos pais alegam que bem gostariam que os seus filhos dormissem
mais e afirmam o seu propósito de a isso passarem a dedicar mais atenção e
determinação. Por isso mesmo, prometo voltar ao tema e apresentar algumas
sugestões que possam contribuir para uma maior pacificação do processo de
dormir.

(Artigo da rubrica «Olhar em Frente», publicada pelo Jornal de Barcelos, em 30
de abril de 2014 - também publicado no livro «Educar Olhando em Frente», em
2018, pela Editora Coisas de Ler)
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