Família: Compromisso, intimidade e muito mais
Maria do Sameiro Araújo é psicóloga especialista em Psicologia Clínica e da Saúde e em Neuropsicologia
Família
Compromisso, intimidade e muito mais
Quando falamos em Família, habitualmente, referimo-nos à união de pessoas que partilham um projeto de vida que esperam que perdure, e que gera fortes sentimentos de pertença a esse grupo. Implicitamente, este conceito de família, tem associado um compromisso pessoal entre os seus membros, e o estabelecimento de intensas relações de intimidade, reciprocidade e dependência; aquilo que pode ser visto como conceito de família ocidental.
No meu livro Família Escola e Sucesso Escolar (2016), resultante da investigação efetuada no âmbito da tese do meu doutoramento (2013), refiro que durante muito tempo, o principal modelo de família estudado foi o modelo chamado de família nuclear, constituída por
marido, esposa e filhos biológicos, mas que este modelo foi ultrapassado por uma visão mais ampla e aprofundada que conclui pela diversidade de família, partindo da realidade marcada pela multiplicidade cultural e a orientação sexual. E destaca-se que, efetivamente, o conceito de família e suas possíveis configurações têm evoluído, de forma muito significativa, devido a fatores de ordem social e cultural, relacionados
com a transformação social do papel da mulher, o aumento da esperança de vida e o aumento da diversidade de situações relacionadas com o divórcio, com a existência de famílias monoparentais, de recasamentos, de situações de adoção, e até da imigração (Carr, 2006; Relvas, 2002; Relvas & Alarcão, 2002; Wagner & Levandowski, 2008).
Tal como destaco no referido livro, prefaciado pelo conhecido psiquiatra e autor, Daniel Sampaio, de acordo com investigadores da área (Stratton, 2003; Turner & West, 1998; Petzold, 1996), tendo em consideração a diversidade de organizações familiares, os diferentes tipos de família mais frequentemente descritos são: i) a família extensa, que inclui pais e filhos a viverem no mesmo espaço com outros familiares ou amigos da família; ii) famílias multigeracionais, que incluem diferentes tipos de gerações que, por sua vez, podem ser considerados outros tipos de família; iii) família reconstituída ou recasada, que se refere a famílias constituídas por dois parceiros em que ambos estão na sua segunda relação ou casamento e as famílias, com pelo menos, dois adultos fornecedores de cuidados a uma ou mais crianças que não são filhos biológicos de ambos os adultos que compõem o casal; iv) família monoparental, formada por um adulto que vive com uma ou mais crianças, devido a falecimento do parceiro, de divórcio ou da opção por não estar envolvido em relação íntima; v) casais que coabitam no mesmo espaço, com ou sem filhos 1 ; vi) viver em proteção de cuidados a alguém, que corresponde à situação em que um adulto (habitualmente mais novo) cuida de outro adulto (habitualmente idoso); e vii) família
homossexual ou casal homossexual que inclui duas pessoas do mesmo sexo, que mantêm uma relação intima e que podem tornar-se pais de uma criança, ou uma mãe 1 Correspondendo, na atualidade do nosso país, às uniões de facto, ou pai homossexuais que não estejam envolvidos m nenhuma relação mas que tenham uma criança a seu cargo (Turner & West, 1998).
Com o Prof. Doutor Daniel Sampaio (e a editora) no lançamento do livro, na livraria Bulhosa, em Lisboa (13/05/2013)
Desta forma, compreende-se que se esteja longe de definições consensuais entre diferentes nvestigadores da área, instituições governamentais dos diferentes países e sociedade, em geral. Isto é tão mais evidente, quanto maior é o impacto da diminuição do significado da referência família normal ou tradicional pois torna-se, cada vez mais necessário, falar da especificidade das famílias e da diversidade dos seus contextos sociais, culturais, étnicos e religiosos (Nichols & Schwartz, 2006).
Do ponto de vista desenvolvimental, tornar-se adulto na família, supõe o estabelecimento de um compromisso de relações íntimas e privilegiadas com, pelo menos, outra pessoa; existindo, nesta relação, elementos que a diferenciam tanto da dependência que se tinha quando se vivia em casa dos pais, quanto da independência que carateriza outras formas de convivência. Quanto mais rica for a forma de convivência que se cria entre as duas pessoas, mais completos serão os elementos de subjetividade entre ambas (Palacios & Rodrigo, 2008; Araújo, 2016).
Referências Bibliográficas:
Araújo, M. S. (2013). Representações de educação e de escola em pais com baixos níveis de
escolarização: relações com o sucesso e o insucesso escolar dos filhos. Tese de
doutoramento em Psicologia, Escola de Psicologia - Universidade do Minho, Portugal.
Araújo M. S. (2015). Família, escola e sucesso escolar. Lisboa: Coisas de Ler.
Carr, A. (2006). Family therapy: Concepts, process and practice (2ª ed.). Chichester, UK: John
Wiley & Sons.
Nichols, M. P., & Schwartz, R. C. (2006). Family therapy: Concepts and methods (7ª ed.). New York: Gardner Press.
Palacios, J., & Rodrigo, M.J. (2008). La família como contexto de desarrollo humano. In M. J.
Rodrigo & J. Palacios (Eds.), Família y desarrolo humano (25-44). Madrid: Alianza
Editorial.
Petzold, M. (1996). The psychological definition of the family. In M. Cusinato (Org.), Research
on family resources and needs across the world (pp. 25-44). Milano-Itália: LEDEdizioni
Universitarie.
Relvas, A. P. (2002). A mulher na família: “Em torno dela”. In A. P. Relvas & M. Alarcão (Eds.), Novas formas de família (298-340). Coimbra: Quarteto Editora.
Relvas, A. P., & Alarcão, M. (2002). Novas Formas de Família. Coimbra: Quarteto Editora.
Stratton, P. (2003). Contemporary families as contexts for development. In J. Valsiner & K.
Connolly (Orgs.), Handbook of Developmental Psychology (333-357). London: Sage.
Turner, L. H., & West, R. (1998). Providing a definition of families. In L. H. Turner & R. West (Orgs.), Perspectives on family communication (1-35). Mountain View, CA: Mayfield
Publishing Company.
Wagner, A., & Levandowski, D. C. (2008). Sentir-se bem em família: Um desafio frente à
diversidade. Textos & Contextos, 7 (1), 88-97.
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